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O ESPELHO

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O ESPELHO

 

Jaime Morais. Graduado em História (2000) com Pós-Graduação Lato Sensu em Desenho, Registro e Memória pela Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS)-2006. Mestre em Memória, Linguagem e Sociedade pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB)-2016. Professor da rede pública do Estado da Bahia desde 2000 e integrou como pesquisador o CENDOP (Centro de Documentação e Pesquisa do Baixo São Francisco), ligado ao Programa Xingó de setembro de 2000 a março de 2001.

 

Estranhei quando um outro dia encontrei um desconhecido, que a mim se dirigiu nesses termos: “E aí, coroa?!” Os anos passam e embora seja um indivíduo de mais de 50 anos, quase chegando aos 60, ainda tenho memórias as quais guardo com muito carinho. Tipo ser tratado por Jaiminho, ou até Jorginho, na amnésia momentânea do meu nome de batismo, ou do registro civil, cujo nome mais próximo remetia ao meu irmão mais velho.

Não me senti ofendido, apesar de estranhar o tratamento. Até porque, o desconhecido deve ter dispensado esse tratamento dessa maneira, por desconhecer minha identidade. Tenho uma estatura mediana, muito embora alguns insistam em dizer que sou baixinho, tamborete de forró, ou outros termos depreciativos, estes sim, com conotação pejorativas. Apesar de não dar bolas a essas observações, a depender do humor de momento, isso pode se tornar uma bola de neve, que pode levar a num instante, reagir de forma inapropriada, mesmo para quem ouviu até dentro da família essas palavras. Mas, algumas observações são ainda mais desconfortáveis que esses dois exemplos anteriores. Como exemplo contundente, cito o de rotular outros como vingativos, rancorosos, invejosos e até como feios.

Para que esses estereótipos não causem um efeito destruidor nos indivíduos, se faz necessário que seja ele portador de espelhos. E os meus felizmente são na mesma proporção do meu tamanho, seja no caso do vidro pintado de cinza no verso, ou nos personagens aos quais os valores confiamos nossos procedimentos. Não estamos com isso querendo afirmar que nos igualamos em virtude a esses. Mas, que tentamos na medida do possível lhes copiar, enquanto modelo de conduta.

Quanto a ser coroa, um tratamento até certo ponto fora de moda, não me sinto enquanto tal, e isso muito se deve a minha família que sempre me dispensou a atenção de irmão mais novo que sou. Pequeno sim, em relação a todos os outros do sexo masculino e de algumas do sexo oposto. Grande na independência das ideias, na sua defesa, na rebeldia contra as injustiças, e que me pedem certa imodéstia, na resistência aos opressores que voam conforme os ventos. Se lhes são favoráveis, aproveitam a carona (outro termo fora de moda), para saborear o bom momento. Como é bom dizer o mais óbvio para conquistar adesões. Tipo, “é necessária uma reforma previdenciária”! Importaria dizer para quem, porque para nós só produz maior pobreza, nos termos que estão postos. Do mesmo modo a reforma política.

O mais importante não é se dizer que qualquer reforma é necessária, mas como fazê-la sem prejudicar quem mais dela carece. Em que espelho esses senhores se viram para produzir, para não cair em contradição e dizer um termo pejorativo, uma lei de proveito nefasto para a nação? Queremos dignidade sim! Queremos ser tratados como parte da sociedade e termos voz, enquanto produtores para enriquecimento de alguns que assim precisam tanto desse bem, que nos falta. Não é isso mendicância. É mais que isso! É necessidade, porque não se produz com falta de incentivo. No período colonial, muitos escravos deixavam simplesmente de trabalhar atacados pelo que se denominava por mal do banzo. Daí o tratamento de banzeiro, porque o indivíduo entrava em depressão pela falta de perspectiva no futuro.

Nossa população anda meio perdida nessa falta de um horizontes mais estáveis. Nas atuais circunstâncias políticas, esse governo precisa terminar o que mal começou, com um arrocho cada vez maior sobre as maioria da população, dissimulada sob um democracia que preserva leis avessas a ela mesma. E se eternizam os mais abusivos sequestros da produção pelo trabalho, para outros se beneficiarem sem um retorno satisfatório, sequer um discurso plausível, mas como imposição de uma elite sem norte. Só usurpadora, enquanto o espelho foi jogado ao lixo, tal qual se descarta um copo de plástico. Mas, essa gente insiste em pensar que o brasileiro é burro, ou vive ainda com as cabeçadas do cabresto, no seu suave rosto enrugado pelas marcas do sofrimento.

Talvez até, ficasse menos ofendido se me tratassem nesses termos, que tentarem forjar um inverdade tão flagrante, como comprar nossas consciências com falsos discursos para beneficiar uma memória. Temos riqueza, até para oferecer a eles, porque somos bons de caráter. Isso, ninguém pode nos tirar.


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