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REMIÇÃO PELA LEITURA IMPLANTADA EM VITÓRIA DA CONQUISTA

REMIÇÃO PELA LEITURA IMPLANTADA EM VITÓRIA DA CONQUISTA

Foi implantado em Vitória da Conquista, pelo Juiz Reno Viana Soares, o Projeto Remição pela Leitura, através da Portaria 04/2016, de 8 de novembro de 2016.

Trata-se de medida que decorre da Lei n. 12.433/2011, que modificou a Lei de Execução Penal para permitir a remição de pena através de leituras empreendidas por condenados presos nos regimes fechado e semiaberto.

A primeira iniciativa de âmbito nacional, para permitir a remição da pena por meio da leitura, foi a Portaria Conjunta 276/2012, do Conselho da Justiça Federal (CJF) e da Diretoria Geral do Departamento Penitenciário Nacional (Depen) do Ministério da Justiça, que disciplinou o projeto de remição pela leitura para os presos de regime fechado custodiados em penitenciárias federais de segurança máxima. No ano seguinte, o CNJ expediu a Recomendação n. 44, que cuida das atividades educacionais complementares para fins de remição da pena pelo estudo e estabelece critérios para a admissão pela leitura.

Nas suas próprias palavras, ditas à PROBUS, o Juiz Reno Viana, apoiando-se em Jean Paul Sartre, lembrou que “o simples ato de ler uma obra literária já significa uma aposta existencial nos valores humanistas e um gesto de negação pessoal da barbárie”.

 

A LEITURA E O CÉREBRO

 

O Projeto articula-se com estudos cerebrais e cognitivistas atuais, já que o efeito da leitura no cérebro tem sido instigantemente renovado a partir de convergências de Psicologia Cognitiva em parceria com as Neurociências Cognitivas. As pesquisas atuais trabalham com exames de ressonância magnética funcional (fMRI) concentrados numa pequena região envolvida no reconhecimento de símbolos linguísticos, conhecida como “área da forma visual das palavras” (VWFA). Segundo o neurocientista Maximilian Riesenhuber, do Centro Médico da Universidade Georgetown, à medida que nos tornamos mais proficientes na leitura, construímos um dicionário visual na área VWFA.

Para José Morais, psicolinguista português e professor emérito da Universidade Livre de Bruxelas, deve-se fazer uma distinção entre a habilidade de ler e a atividade de leitura, sendo a primeira ligada à leitura em si e a segunda à compreensão do que está escrito.

Para exemplificar, em palestra no IPUSP, Morais lembrou a história do poeta inglês John Milton que ensinara suas duas filhas a ler em várias línguas: “Quando ficou cego, as meninas liam para o pai, embora elas mesmas não compreendessem bem os textos, já que eram em idiomas que elas não dominavam (como o grego), além de complexos para a idade delas. Ora, mesmo sem entender, elas foram capazes de transformar um código escrito em língua falada. É parecido, por exemplo, quando lemos um texto em português, mas com palavras que não conhecemos. Mesmo sem compreender o que aqueles termos significam, somos capazes de pronunciá-los”. (Disponível em: http://www.ip.usp.br/revistapsico.usp/index.php/2-uncategorised/9-se-ler-pode-abrir-a-mente-com-certeza-mudar-o-cerebro-2.html).

A pronúncia, ainda segundo Morais, pode se dar em voz alta, mas mesmo na leitura silenciosa há uma “pronúncia mental”.

A respeito da pronúncia, há outro estudo atual, liderado pelo neurocirurgião Lorenzo Magrassi, da Universidade de Pavia, na Itália, que, em companhia de seus colegas, submeteu 16 indivíduos a eletrocorticografia (ECoG) – técnica invasiva em que os eletrodos são colocados cirurgicamente no cérebro – e mediram a atividade neural diretamente da superfície da estrutura geradora de linguagem, conhecida como a área de Broca, enquanto os participantes liam um texto em silêncio ou em voz alta.  A área de Broca respondeu à leitura silenciosa de maneira bem similar àquela em que neurônios auditivos reagiram ao texto dito em voz alta, como se essa estrutura cerebral produzisse o som dos termos para que os leitores pudessem ouvi-los internamente.

José Morais focalizou isso em sua palestra e exemplificou com a diferença entre ler “cadeira”, ouvir “cadeira” e ver uma “cadeira”, que envolvem tanto processos semelhantes (para se compreender “cadeira” como sendo o mesmo objeto) quanto processos particulares de cada atividade, já que ler é diferente de ouvir que é diferente de ver.  

 

  Imagem disponível em: http://www.ip.usp.br/revistapsico.usp/index.php/2-uncategorised/9-se-ler-pode-abrir-a-mente-com-certeza-mudar-o-cerebro-2.html

 

OS EFEITOS PÓS-LEITURA NO CÉREBRO

 

 

Já o  estudo publicado no Brain Connectivity e  liderado por Gregory Berns, neurocientista da Universidade de Emory, nos Estados Unidos, com 21 estudantes de graduação, focaliza outro ponto: a leitura de um livro, um romance, por exemplo, provoca mudanças de conectividade no cérebro, que persistem mesmo alguns dias após o término da leitura.

Enquanto as pesquisas citadas e outras da mesma natureza utilizam a ressonância magnética funcional (fMRI) concentrado na VWFA a fim de identificar as redes cerebrais associadas à leitura, sobretudo durante a leitura,  o estudo de Berns e sua equipe teve como foco os efeitos naturais que permanecem no cérebro após essa atividade.

A pesquisa utilizou a seguinte metodologia: os 21 estudantes foram submetidos a exames de ressonância magnética por 19 manhãs seguidas. Nas cinco primeiras, o propósito foi fazer o registro da atividade normal do cérebro durante o repouso. Em seguida a esse prazo, começaram a ler o romance Pompeia, de Robert Harris, que se baseia em um evento real, a erupção do Monte Vesúvio, na Itália, e focaliza o personagem principal, que, de fora da cidade, percebe a fumaça e tenta retornar para salvar sua amada.

As leituras eram feitas à noite e os participantes se submetiam à ressonância magnética pela manhã. Após o fim do período de leitura, os estudantes ficaram sob observação em laboratório por mais cinco dias para que os pesquisadores avaliassem se os efeitos da história tinham permanecido, o que se confirmou com resultados demonstrando aumento da conectividade de uma região do cérebro associada à recepção da linguagem.

Outro aumento de conexões foi identificado no sulco central do cérebro, região ligada à função motora: “os neurônios dessa região estão relacionados à criação de representações de uma sensação do corpo – o simples pensar em correr, por exemplo, pode ativar os neurônios associados ao ato físico de correr” (Disponível em: http://veja.abril.com.br/ciencia/estudo-mostra-que-a-leitura-e-capaz-de-modificar-o-cerebro/).

Sobre o resultado final da pesquisa, Berns comentou que “nós já sabíamos que boas histórias podem te colocar no lugar de outra pessoa, em um sentido figurado. Agora estamos percebendo que algo assim também ocorre biologicamente”.

 

NUNCA É TARDE PARA APRENDER A LER E MUDAR O CÉREBRO

 

Uma preocupação que pode surgir do Projeto Remição pela Leitura é quanto aos que não aprenderam a ler.

Todavia, outro estudo que envolveu cientistas, inclusive José Morais, e voluntários portugueses, numa pesquisa internacional inédita sobre os efeitos da leitura no córtex cerebral, comparou o cérebro de analfabetos, letrado e ex-iletrados (que aprenderam a ler já adultos).

Os participantes, submetidos a ressonância magnética funcional,  foram dez analfabetos brasileiros, 22 pessoas que aprenderam a ler já adultas (12 deles portugueses, alguns recrutados na zona de Paris) e 31 letrados (11 portugueses).

A pesquisa fundou-se na hipótese de reciclagem neuronal, de  Stanislas Dehaene, cientista do INSERM-Instituto Nacional da Saúde e da Investigação Médica francês. Segundo ela, sendo a escrita algo relativamente recente na história humana, com cerca de 6000 anos, não houve tempo suficiente para que se desenvolvessem estruturas físicas no cérebro. Com isso, o cérebro de cada pessoa que aprende a ler se modifica para acomodar as novas capacidades, porque dotado de grande plasticidade..

A conclusão a que chegaram os pesquisadores é de que nunca é tarde para aprender. Morais assim sintetizou os resultados:  “O cérebro dos ex-analfabetos só em poucas coisas difere do dos alfabetizados, está muito mais próximo destes; ensinar alguém a ler na idade adulta tem os mesmos efeitos do que ensinar uma criança. É uma boa notícia, não há razão para desistir dos iletrados". (Disponível em: https://www.publico.pt/ciencia/noticia/o-cerebro-de-um-adulto-muda-tanto-como-o-de-uma-crianca-quando-aprende-a-ler-1465736)

 


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