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EDUARDO CUBAS: JUIZ TEM QUE TER CORAGEM

EDUARDO CUBAS: JUIZ TEM QUE TER CORAGEM

EDUARDOS CUBAS: JUIZ PRECISA TER CORAGEM

 

O Juiz Federal Eduardo Cubas é o primeiro entrevistado da PROBUS.

Trata-se do Presidente da União dos Juízes Federais do Brasil – UNAJUF, conhecido por decisões e condutas corajosas que nem sempre lhe renderam simpatias nos estamentos judiciários.

Tendo começado a carreira como motorista do Supremo Tribunal Federal, assessor no Superior Tribunal de Justiça, Juiz de Direito em Goiás, Professor da PUC Goiás, para chegar à magistratura federal com 27 anos,  Cubas, que é mestre em Direito Penal pela Universidade de Salamanca, com passagens pela Nova Zelândia e Peru, é um dos nomes mais conhecidos na Justiça Federal.  Já esteve em Vitória da Conquista para participar de Mutirão Previdenciário em ações de benefícios rurais e chamou a atenção por, diferentemente dos seus colegas, ter dispensado assessor para digitar ele mesmo os termos enquanto presidia as audiências.

Mas se notabilizou mesmo por ir contra a nomeação de Gilmar Mendes para o Supremo Tribunal Federal, em 2002, alegando que, se ele tinha notável saber jurídico, faltava-lhe reputação ilibada para ocupar o cargo.  Por ocasião da nomeação de Antônio Dias Toffoli, repetiu a dose.

Nessa entrevista, ela fala de sua visão de um Judiciário melhor e comenta ainda  decisão de um colega seu de Brasília, Juiz Federal, que indeferiu a petição inicial da ação proposta pela UNAJUF para que se dê ampla publicidade aos editais para composição do Conselho Nacional de Justiça – CNJ, órgão que exerce o controle externo da magistratura no Brasil.

A entrevista foi feita via Whatsapp por Filipe Lima, Diretor de Publicidade da PROBUS.

 

PROBUS: o senhor é um Juiz polêmico? Por quê?

CUBAS: Não sou um Juiz polêmico, então não tenho que responder por que sou polêmico. A segunda parte da pergunta está prejudicada, então.

Sou um Juiz que procura, na compreensão que tenho do sistema democrático, ser o que a Constituição espera que cada um dos juízes seja: próximo dos anseios sociais e capaz de traduzi-los fora dos esquemas conceituais dos compêndios e sinopses.

PROBUS: O senhor não acha que essa sua maneira de protestar contra o “establishment” judiciário não termina ajudando a fortalecê-lo e apenas atrai antipatia ou mesmo indiferença jocosa para seu esforço?

CUBAS: William James, filósofo pragmatista americano, dizia que basta um único corvo branco para provar que nem todos os corvos são pretos.

Portanto, dentro de mim, guardo a convicção de que o Juiz que não olha para seu próprio umbigo, desfila cultura livresca em suas palestras, veste-se como se estivesse na Sibéria, embora esteja no calor dos trópicos, não tem mesmo como entender chamada “voz rouca das ruas”, como dizia Ulysses Guimarães.

PROBUS:  O senhor, ao citar  filósofo como William James, não é também o tipo intelectual que critica?

CUBAS: Eu não critico “tipos intelectuais”, Filipe. Critico um saber intelectual consumido pela pátina do tempo, ou seja, que não serve a não ser para aumentar o sulco que divide os anseios populares e as instituições públicas.

Não acho que o conhecimento jurídico, com essa modelagem atual, possa dar conta da vastidão de problemas que são nossos, e não dos americanos, dos italianos, dos franceses, dos alemães.

PROBUS: O que são “anseios sociais” para o senhor? Essa expressão não é vaga?

CUBAS: É vaga mesmo. Para os juristas, que não fazem pesquisa, para os juízes que não saem de suas vestimentas e dos seus gabinetes e veículos refrigerados para saber o que se sofre, para entender a distância que separa seu saber academicista e os problemas das pessoas que as levaram a procurar a Justiça.

Pergunte ao sociólogo, ao antropólogo, se “anseios sociais” é uma expressão vaga. Creio que não, pelo que leio.  A diferença desse saber acadêmico para o jurídico é a pesquisa.

PROBUS: Há juízes que pensam como o senhor na magistratura?

CUBAS: Tenho certeza de que sim. Percorri o Brasil inteiro em contatos com colegas. Além disso fui Juiz no Pará alguns anos, na Bahia (Barreiras), em Goiás e em Brasília.

PROBUS: O que essa sua maneira de pensar em termos de efetividade social do Judiciário tem a ver, por exemplo, com sua indisposição contra nomeação de Gilmar Mendes para o STF?

CUBAS: Tudo. O Judiciário precisa ser transparente. Não há sentido em ele combater improbidade, pregar impessoalidade e publicidade e não permitir que as regras internas do funcionamento de sua máquina possam sofrer controle ou questionamento.

Não havia transparência no modelo de atuação moral de Gilmar Mendes. Propus aquela ação para que se discutisse isso com profundidade.

 

PROBUS: Por que o senhor acha que não vingou a ação judicial?

CUBAS: Pela mesma razão que aparentemente nunca vai vingar: o Judiciário gosta de dizer como deve ser a vida de todo mundo, mas não gosta que saibam da dele. Ninguém sabe como se operam essas regras.

Semana passada, propus, representando a UNAJUF, ação civil pública para que a composição do CNJ, que exerce o controle externo da magistratura, seja feita com publicidade.

Os jornais estão noticiando que virou uma questão de esquema de dominação ocupar as cadeiras do CNJ. Se for isso, é mais do mesmo.  Ou seja, continuará a ser um dos Judiciários mais caros e ineficientes do mundo.

Mas veja você em que resultou a ação: o Juiz Federal extinguiu sem julgamento de mérito, com um fundamento bizarro de que a UNAJUF, que é uma associação de Juízes, não pode sair na defesa da moralidade na composição do CNJ.

Juiz sem coragem é pior dos males numa estrutura de Justiça. Mas isso é o que bem tem.

PROBUS: O senhor não acha que essa mentalidade está mudando com o perfil mais recente do Judiciário combatendo a improbidade e a corrupção?

CUBAS: Não há dúvida que esse perfil tem suas virtudes. Vejo mérito nisso, desde que doravante as regras dessa atuação judiciária valham para todos os investigados e, ao mesmo tempo, não transformem o Judiciário, Ministério Público e Polícia em órgãos a ser temidos, e sim a ser respeitados.

Se começarmos a manter gente presa para “jogar para a galera”, apenas estaremos invertendo a polaridade, ou seja, deixaremos de ser omissos para sermos justiceiros. Não sei qual o pior.

Por outro lado, se não se  mudarem regras como, por exemplo, para banir aposentadoria compulsória de Juiz corrupto, isso sempre servirá de estímulo.

 

 

PROBUS: Me dê um exemplo de medida que ajudaria o Judiciário a ser transparente.

CUBAS: Acredito que, se fosse permitido aos Juízes de 1º grau inspecionar os Tribunais, estaríamos a um passo de chegar perto de acabar com privilégios.

O grande problema, o problema sistêmico, do Judiciário está nos Tribunais. Não no 1º grau. Somos levados a achar que o Juiz fanfarrão é a demonstração expressa do mau funcionamento do Judiciário. O mau funcionamento é oculto. Ele não aparece. Está nos privilégios e contatos lá em cima que não chegam, a não ser em pequenas doses, ao grande público.

Vou lhe dar um exemplo: recentemente uns Ministros do STJ promoveram a suspensão de uma gratificação aos Juízes de 1º grau quando fizessem trabalho de outros Juízes, por deficiência estrutural.  Tratava-se de gratificação prevista em lei sancionada pela então Presidente Dilma Roussef.

Fizeram um escarcéu com isso. Mandaram até para o TCU, que, depois de remexer a questão, disse não haver ilegalidade alguma.

Contraditoriamente, uma das Ministras já tinha ido parar na imprensa por receber, num único mês, 420 mil reais. O outro Ministro está sendo investigado por improbidade e favorecimento.  

Mas ninguém tem acesso a essas informações.

Portanto, nada melhor que se um Juiz de 1º grau pudesse vasculhar tudo isso. Mas o prurido estamental da hierarquização rígida não admite isso.

PROBUS: O que o senhor quer dizer com “hierarquização rígida”?

CUBAS: A você Juiz de 1º grau não é dado saber ou questionar o que se passa lá em cima. Mas lá em cima está o problema. Quando o Juiz de lá quer aparecer, ele se volta contra alguns Juízes de 1ª instância, que são problemáticos, e espera com isso ser lembrado para Ministro do Executivo, Senador ou até Presidente da República.

Ou seja, a pressão que funciona no Judiciário é de fora. Daí eu ter me indisposto com esse loteamento de vagas do CNJ, a julgar pelo que está sendo anunciado pela imprensa.

Todavia, não deixa de ser uma distorção grave no sistema que para que, por exemplo, questões raciais, sexuais, étnicas, indígenas, etc, possam ser vistas com outros olhos pelo Judiciário, tenhamos que esperar que os olhos que não são dele, como os dos observadores internacionais, façam pressão para que algo mude.

PROBUS: Se é assim, por que o senhor, um Juiz de 1ª instância, continua querendo combater as mazelas do Judiciário?

CUBAS: Se aparecer uma PEC dizendo que tem que sacrificar seu direito a uma boa educação ou à saúde, você vai aceitar e dizer “só resta me conformar”?

Por isso mesmo estou impugnando essas nomeações ao CNJ.

 


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